Fernando Pessoa nasceu a 13 de Junho de 1888 - algumas curiosidades da sua vida

Muitos sabem que Fernando António Nogueira Pessoa, de seu nome completo, nasceu no Dia de Santo António, mas se calhar muitos não fazem ideia de que a família reclamava uma ligação genealógica com Fernando de Bulhões, o nome de batismo de Santo António. 
Sabemos ainda que a frase “primeiro, estranha-se, depois entranha-se" pertence ao poeta acima citado, mas haverá provavelmente quem não saiba que aquele foi o slogan por si escolhido em 1929 para a Coca-cola, quando a marca encomendou uma campanha publicitária à agência Hora, onde Pessoa trabalhava – e que, no entanto, por razões políticas, a bebida não entraria em Portugal nesse ano, mas apenas depois do 25 de Abril. Ou mais precisamente no verão de 1977, na baixa lisboeta, numa garrafa de vidro com 0,2 litros.
1 – Celebramos agora o seu nascimento, mas é o seu funeral que permanece numa zona escura – talvez porque, à data, Fernando Pessoa ainda não era um símbolo da literatura portuguesa. Já tinha recebido o Prémio Antero de Quental, atribuído pelo Secretariado Nacional de Informação (dirigido por António Ferro, o jovem editor da Orpheu, revista trimestral de literatura), pela obra “Mensagem”, mas continuava a ser apenas um empregado de escritório conhecido nos círculos culturais, o que ajudará a explicar porque havia apenas dez pessoas a acompanhar a cerimónia fúnebre em Campo de Ourique – entre alguns intelectuais, como António Botto (autor inovador seu amigo e primeiro português a assumir publicamente que era homossexual), e ainda conhecidos do bairro, como o seu barbeiro. E só cinco anos depois é que as suas obras despertariam interesse do público.
2 - É público que só viveu 47 anos e que, no seu atestado de óbito, consta que a morte foi devida a uma obstrução intestinal – podendo até considerar-se que foi um pouco inesperada, dado que sobreviveu às doenças mais mortíferas da época, como a tuberculose ou as epidemias de gripe. O diagnóstico de internamento, no entanto, indicava ‘cólica hepática’ associada a cirrose, muito provavelmente causada pelo consumo excessivo e prolongado de álcool, mas há também que o conteste e defenda que a causa de morte pode ter sido uma inflamação aguda no pâncreas. Segundo os seus biógrafos, opôs-se ao internamento e passou as últimas horas praticamente sozinho, tendo apenas a visita da enfermeira, do médico e do capelão. As últimas palavras? “Dá-me os óculos”.
3 - Ofélia Maria Queiroz Soares foi a única namorada que lhe conhecemos (diz-se que sabia de cor todas as cartas que o poeta lhe escreveu), mas uma série de escritos poéticos do seu último ano de vida permitem hoje dizer que o seu último amor foi uma inglesa loira. O mistério foi revelado num dos números da "Pessoa Plural" (revista académica internacional, dedicada a estudos sobre Fernando Pessoa, editada pelo Departamento de Estudos Portugueses da Brown University, em Providence, capital do estado de Rhode Island, nos EUA).
4 – Chama-se Névoa e é considerado o poema esquecido de toda a obra de Pessoa. Foi em 1930 que foi publicado num jornal açoriano e por lá ficou esquecido até que um investigador o encontrou, por acaso, mais de 80 anos depois. Impresso no Diário dos Açores, o mais antigo jornal diário do arquipélago, cinco anos antes da sua morte, era ainda acompanhado de um texto sobre o poeta, da autoria de Rebelo de Bettencourt, um jornalista açoriano seis anos mais novo do que Pessoa e que também tinha participado na Portugal Futurista, revista de edição única, antes de ser apreendida pela polícia.
5 - A polémica estalou no início deste ano e obrigou o historiador José Barreto, que há 15 anos trabalha no espólio de Fernando Pessoa, a vir a público a público defendê-lo: “é desonesto dizer que ele era racista e esclavagista.” Tudo começou quando o jornal Expresso das Ilhas, de Cabo Verde, questionou a escolha do nome do poeta para o programa de intercâmbio académico dentro dos países da CPLP – lembrando que o português teria tecido, a dada altura, comentários racistas sobre alguns povos africanos. No texto em questão, que acabou por vir a público embora Pessoa nunca tenha tido intenção de o publicar, a escravatura é descrita como "lógica e legítima". Segundo Barreto, Pessoa era claramente classista e elitista, mas não propriamente racista. “Também há escritos seus a condenar as teorias raciais e até o colonialismo”, justificou.
6 - Parece que a astrologia e o pensamento mágico também marcaram a vida de Fernando Pessoa. A verdade é que ele tinha a mania de fazer mapas astrais, dos amigos aos parentes, dos conhecidos às personalidades históricas. Ao todo, terá criado cerca de 300 cartas astrológicas, espólio que inclui as usadas para traduzir a personalidade dos seus ‘amigos imaginários’ e também as que o ajudaram a prever eventos ou o sucesso de instituições - mesmo que depois isso não tenha acontecido, como sucedeu com a empresa Íbis, fundada por ele ainda muito novo e com a qual perdeu imenso dinheiro. Mas a sua confiança nos astros era tal que, diga-se ainda, chegou a desistir de um encontro marcado em Lisboa com a poetisa brasileira Cecília Meireles, porque a conjunção dos planetas não lhes era favorável.
7 - É conhecida a sua ligação ao hoje mítico café a Brasileira, no Chiado, mas seria no estabelecimento Martinho da Arcada, na Praça do Comércio, que travaria conhecimento com o ocultismo e o misticismo, interesses que chegariam a organizações como a da fraternidade Rosa-Cruz e da Maçonaria. Aliás, foi da demonstração desse apreço que nasceu o poema “No Túmulo de Christian Rosenkreutz” e que o poeta acabou a participar em convívios com o ocultista britânico Aleister Crowley – um encontro desencadeado pelo facto de ter lido as memórias do mago e encontrado um erro no seu horóscopo.
8 – Conhecido como brilhante poeta, Pessoa também trabalhou como jornalista, tradutor, crítico literário, editor, publicitário e até inventor, tão talentoso que era. O que poucos sabem é que também encontrou tempo para exercer ativismo político. Ora foi entre Fevereiro e Outubro de 1935, no último ano da sua vida, que produziu uma série de escritos, vários deles contra Salazar e o Estado Novo, além de outros a condenar a invasão da Abissínia (atual Etiópia) pela Itália fascista, produção que a censura salazarista, claro, não deixou passar. Assinou também, na mesma época, diversos textos e poemas anticatólicos, além de outros textos em defesa da liberdade e da dignidade humanas.
9 – A prova de que o mundo inteiro se rendeu a Pessoa tem já, pelo menos, meia dúzia de anos, data do primeiro Congresso Internacional que reuniu durante três dias, em Lisboa, dezenas especialistas de diferentes nacionalidades. Ora cinco anos antes disso, em 2008, o Bureau Internacional das Capitais da Cultura já o tinha escolhido como uma das 50 personalidades mais influentes da cultura europeia, juntamente ao arquétipo da Renascença Leonardo Da Vinci, ao prolífico compositor clássico Wolfgang Amadeus Mozart e ainda ao físico alemão Albert Einstein.
10 – Mais recentemente, o seu nome voltou a estar envolto numa outra polémica, quando se descobriu que um poema seu tinha sido censurado num manual escolar do 12º ano – ou pelo menos, "amputado". O caso deu-se no livro Encontros, da Porto Editora, que optou por retirar três versos do poema Ode Triunfal, de Álvaro de Campos, exatamente os que têm linguagem que pode ser considerada obscena, tendo sido substituídos por linhas a tracejado. Em causa estão os versos “Ó automóveis apinhados de pândegos e de putas” e “E cujas filhas aos oito anos – e eu acho isto belo e amo-o! / Masturbam homens de aspeto decente nos vãos de escada”. A editora admitiu a omissão, mas recusou qualquer censura e replicou que o poema está completo na versão para os professores - de forma a que sejam estes a decidir se os vão, ou não, introduzir em contexto de sala de aula.

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