Dia 5 de Outubro Implantação da República

Implantação da República Portuguesa foi o resultado de uma revolução organizada pelo Partido Republicano Português, iniciada no dia 2 de Outubro e vitoriosa na madrugada do dia 5 de Outubro de 1910 

Mas sabiam que foi uma jovem de 16 anos que serviu de modelo para o Rosto da República?


Em 1910, uma jovem de 16 anos serviu de modelo para o Rosto da República ao escultor Simões de Almeida, sempre sob o olhar atento da mãe. 

Chamava-se Hilda Puga e a sua vida foi plena de aventuras. 

Foi uma mulher invulgar, que sobreviveu a dois cancros, esteve casada dois meses, foi rica mas teve de tornar-se costureira para sobreviver e morreu no dia em que celebrou 101 anos.

Até 1970, Hilda Puga andava nos bolsos de todos os portugueses. Era dela o rosto das moedas de 5 escudos e de 50 centavos, fruto do serviço patriótico que prestou muitos anos antes, quando a República foi instaurada, em 1910. Ela, que "até era profundamente monárquica, muito católica e reaccionária", recorda o neto, Nuno Maia, 50 anos, "aceitou o pedido do escultor Simões de Almeida por amor ao País." Hilda tinha 16 anos, e trabalhava numa camisaria na Rua Augusta, na Baixa de Lisboa. Estava a fazer uma entrega quando se cruzou com o escultor, que lhe achou graça e a convidou para ser sua modelo.

Como Hilda era menor de idade, Simões de Almeida teve de pedir autorização à mãe dela, que lhe impôs duas condições: a primeira, ela própria teria de estar presente nas sessões - que duraram duas horas, durante um mês; e a segunda era que a filha teria de posar vestida. Foi esta, aliás, a razão que levou Hilda Puga a só falar abertamente deste episódio depois dos 90 anos... É que o busto de Simões de Almeida mostra uma mulher de amplo decote, e Hilda jura "que só tinha desabotoado um botão da camisa..." :)

Este poderia ser um episódio de relevo na vida de muita gente, mas para Hilda foi apenas um numa vida cheia de aventuras e reviravoltas. Nas primeiras está, por exemplo, uma viagem de barco de meses até ao Amazonas. Nas reviravoltas da vida estão a perda do pai e a passagem de menina rica a costureira.
O pai de Hilda, Tomás Garcia Puga, era um homem abastado, proprietário da fábrica de tijolos da praça de Touros do Campo Pequeno (Lisboa). Apaixonou-se pela empregada, com quem viveu a vida toda e de quem viria a ter cinco filhos – mas o ato de amor custou-lhe o corte de relações com a família de origem, que nunca aceitou uma união tida como "inferior". Um revés nos negócios obrigou Tomás Puga a vender a fábrica. Atraído pelo Eldorado da borracha no Novo Mundo, em finais do século XIX, ruma a Iquitos, na Amazónia Peruana, onde ergue um armazém geral. A vida corre bem, tanto que, passados poucos anos, Tomás chama a família toda. Numa longa viagem de mais de três meses, de "vapor, barco e piroga", Hilda, a mãe e os quatro irmãos rumam de Lisboa até Belém do Pará.
Passaram-se três anos felizes na Amazónia, até que Tomás Puga adoece com beriberi, uma doença tropical. O médico dita a sentença: Tomás tem de regressar a um clima temperado, sob pena de morrer. A família Puga embarca de novo, de regresso a Lisboa – mas o chefe de família não aguenta a viagem e morre a bordo, ao largo de Cabo Verde. O funeral é feito no mar. À chegada à Lisboa, sem o sustento da família, esperava-os a miséria.
Foi a educação dos anos de desafogo financeiro, que proporcionou aulas de piano, costura e bordado, que permitiu à mãe e às irmãs Puga sobreviverem. Hilda dedicou-se à costura – nunca deixou de costurar, a vida toda. "Fê-lo diariamente até aos 96 anos", conta o neto - "lençóis, toalhas, fardas de empregada, crochet", e ocupava-se muito em leituras. Mas a vida ainda lhe reservaria outros desafios.

Ainda antes dos 30 anos, Hilda teve um primeiro cancro de mama, que o pai do médico Gentil Martins retirou. Na mesma altura, casou-se, com um jornalista – foi a última das irmãs a fazê-lo. Mas também aqui não teve sorte, permanecendo casada escassos dois meses. Arremessou um candeeiro à cabeça do marido, e, apesar de muito católica, pediu o divórcio em 1932 (ainda antes da Concordata ser assinada em Portugal), somando para si mais um estigma social: o de mulher divorciada.


Não tornou a casar-se, e nunca teve filhos – mas criou como tal uma sobrinha, Emília, que lhe chamaria sempre "mamã". Aos 60 anos, Hilda teve um cancro na outra mama, e mais tarde, retirou outro tumor, na barriga. Cegou ainda de um olho, o esquerdo. A tudo isto sobreviveu. Com a costura, sustentava a mãe e filha "adoptiva". Até que esta se casou, em 1957. Após 3 anos de vida em comum com Emília e o marido, optou por ir para um lar, aos 77 anos. Estava muito habituada ao seu espaço, e custava-lhe ter de prescindir da sua liberdade.
Onze anos mais tarde, sofreu o maior de todos os golpes: Emília morria, de cancro de mama. Hilda remeteu-se à clausura total, no lar, não saindo de lá durante uma década. Foi preciso nascer o primeiro sobrinho neto para tornar a passar o Natal em família. Em 1991, parte uma perna e cai à cama. Nessa altura, o seu maior problema era "não poder costurar". Dois anos depois, falece, aos 101 anos. Morria o rosto da República, cuja implantação se assinala esta quarta-feira.





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